A apocalíptica judaica como matriz da teologia cristiana?

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Qumrán Instituut – Universidade de Groningen 

“Os começos são, na sua maioria, ocultos. E isto também se aplica aos começos do cristianismo postpascual”. Assim começava o artigo que Ernst Käsemann publicou em 1960 e que desencadeou a polêmica refletida no interrogante que serve de manchete a este trabalho l. Nesse artigo, cuja manchete era: “Os começos da teologia cristiana”, e nos que Käsemann se sentiu obrigado a escrever para precisar seu pensamento à vista das reações suscitadas 2, o autor tentava desentranhar o mistério das origens da teologia cristiana, descobrir as raízes da árvore de frutos pluriformas que nos mostra o Novo Testamento e encontrar a terra fecunda cuja seiva alimenta as raízes dessa árvore e lhe permite dar frutos tão diversos. A resposta de Käsemann era clara e sem rodeios: a matriz engendradora de toda teologia cristiana foi a apocalíptica: “A apocalíptica -posto que, propriamente falando, a pregação de Jesus não pode caracterizar-se como teologia- tem sido a mãe de toda a teologia cristiana” 3. 

A finalidade desta conferência, quase trinta anos depois da publicación do artigo original 4, é a de reavaliar novamente o problema à luz dos conhecimentos adquiridos nos últimos anos sobre a apocalíptica judaica. Eu não sou um teólogo; também não um especialista do Novo Testamento. Meu campo de trabalho está formado pela literatura judaica posterior à Tanak (Bíblia) e anterior à Mishnah, a literatura judaica que se situa cronologicamente entre o Antigo e o Novo Testamento, e uma parte da qual pode definir-se como literatura apocalíptica. O que implica que minha maneira de focar o problema não inicia do resultado final: as teologias do Novo Testamento, mas do suposto ponto de partida: a apocalíptica judaica. 

Meu método de trabalho será muito simples: começarei por apresentar o mais breve e objetivamente possível a hipótese de Käsemann; passarei a seguir, a discutir de uma maneira igualmente breve esta hipótese, e dedicarei a terceira parte de minha comunicação a delinear uma nova forma de compreender o problema que possa permitir-nos o responder à pergunta que forma o ponto de partida de uma maneira distinta à de Käsemann e distinta igualmente à dos seus detratores. 

HIPÓTESE DE KÄSEMANN 

A tese central: “A apocalíptica … tem sido a mãe de toda teologia cristiana”, é precisada assim por Käsemann: “A apocalíptica postpascual é a mais antiga variante e interpretação do kerigma” 5. Esta formulação nos precisa o significado que Käsemann dá a sua tese. A apocalíptica em questão é fundamentalmente a apocalíptica cristiana primitiva; esta apocalíptica entra em cena depois da experiência pascual; ela é fundamentalmente uma reação, uma modificação, e eventualmente uma substituição, da pregação do Jesus histórico. “A experiência pascual e a recepção do Espírito motivaram à cristandade primitiva a responder de novo apocalipticamente à pregação de Cristo sobre a proximidade de Deus e de certa maneira a substituí-la” 6. 

Para Käsemann, Jesus está fora desta apocalíptica; ainda mais, Jesus não pode ser considerado de modo algum como um apocalíptico, nem seus ensinamentos podem considerar-se como a fonte ou a inspiração da apocalíptica cristiana. Käsemann reconhece que Jesus teve relações com João Batista e que a pregação do João Batista é claramente apocalíptica, mas põe a ênfase em que a pregação de Jesus não tem relação alguma com a apocalíptica: “O assunto se apresenta assim: Jesus parte da mensagem profundamente apocalíptica do João Batista, mas sua própria pregação não se encontra influenciada constitutivamente pela apocalíptica, mas anuncia a iminente proximidade de Deus” 7. 

a) A apocalíptica postpascual 

Apoiando-se sobretudo no Evangelho de Mateus 8, Käsemann tenta reconstruir a grandes rasgos da história desta apocalíptica postpascual 9. Segundo Käsemann, Mt 7,22-23 nos conservaria a polémica contra um grupo de profetas pertencentes a um movimento de entusiastas de origem palestina; Mt 25,8-10 nos ofereceria um ataque contra uma espécie de rabinato cristiano desenvolvido ao interior da comunidade; Mt 5, 17 -20 conteria os restos de uma exortação a observar em detalhe a Torá, profundamente modificada pelo evangelista; Mt 10,5-6 refletiria a oposição judeu-cristiana à missão aos samaritanos e gentis. Estes quatro textos, e as indubitáveis polémicas que contêm, lhe permitem concluir que na Igreja primitiva existiam dois grupos antagónicos: um grupo judeu-cristiano rigoroso, fiel aos preceitos da Torá e interessado unicamente na missão aos judeus, na recuperação das ovelhas perdidas de Israel para completar a unidade messiânica das doze tribos e possibilitar assim a parusia, e outro antinomista, formado em torno a Estevão e aos sete e comprometido na missão aos gentis, como testemunham os Fatos dos Apóstolos Este grupo passará a Antioquia e preparará o caminho de Paulo. O grupo judeu-cristiano, herdeiro da apocalíptica judaica, se estabelecerá em pequenas comunidades na fronteira da Palestina e Síria. Em Mt 10,41 Y 13,16-17 Käsemann descobre inclusive uma forma de organização destas comunidades nas que há um profeta a serviço do grupo e um presbitério que governa seus assuntos. 

Mateus lhe serve igualmente para precisar a teologia desta apocalíptica postpascual. Ela teria sido a primeira em introduzir dentro do cristianismo uma teologia da história, com sua visão da história da salvação e da história da condenação, que marcham paralelas e que dividem o tempo em dois éons distintos, una teologia da história que, em definitiva, fez possível uma “história evangélica” 10; textos como Mt 19,2829; Mt 10,13-14; Mt 7,2 e outros lhe permitem atribuir a esta apocalíptica postpascual a introdução da concepção de um ius talionis escatológico que transforma a parêneses gnómica em uma ameaça escatológica 11; Mt 10,26 lhe leva a atribuir a primeira formulação de “a lei apocalíptica da transformação de todos os valores no tempo final” 12, e Mt 10,23 a reintrodução do tema da reunião das doze tribos nos últimos tempos 13. Sobre tudo, Käsemann encontra em Mateus os elementos chaves desta apocalíptica postpascual: a espera fervente da parusia do Senhor, a defesa acalorada da lei mosaica e a oposição decidida à missão aos gentis. 

Käsemann se esforça em precisar as origens desta apocalíptica postpascual, ainda que reconheça que este é um dos problemas principais da sua hipótese 14. Como fiel bultmanntiano, defende que toda teologia é postpascual e tenta desligar completamente esta apocalíptica da pregação de Jesus sobre a imediata proximidade de Deus. Para ele, esta ideia é incompatível com a espera da vinda do Filho do Homem, a restauração das doze tribos no reino messiânico e a espera da parusia 15, que são característicos da apocalíptica postpascual. Embora seu entorno fosse apocalíptico, Jesus rompe claramente com ele através da pregação de um Deus clemente e não justiceiro e sua proclamação do primado do amor fraterno. Nada estranho que, para Käsemann, este Jesus nem batize, nem construa uma comunidade como “resto” e núcleo do povo de Deus messiânico, nem mantenha outros preceitos da Lei fora do amor fraterno 16. Os discípulos, pelo contrário, após a experiência pascual, interpretam e conceptualizam esta experiência com as categorias da apocalíptica judaica do seu entorno. A espera do imediato retorno do Senhor constitui o elemento central deste “entusiasmo postpascual”, como o chama Käsemann: posto que o Messias da apocalíptica judaica devia manifestar-se em Jerusalém, é ali onde se dirige a primitiva comunidade; posto que este Messias era esperado como Filho do Homem celestial, à espera do seu retorno constitui o tema central da sua esperança; a mesma ressurreição de Jesus é vista não como um milagre isolado, mas como o começo da ressurreição dos mortos esperada na apocalíptica e como um signo anunciador da chegada do Reino; a comunidade, unida na sus esperança, se considera o resto sagrado da antiga aliança que deve reunir de novo às doze tribos e antecipa já a nova aliança escatológica; posto que a apocalíptica interpreta os “signos” (o êxtase ou as curas, por exemplo) como signos do Espírito do fim do mundo, a experiência pascual do Espírito lhe leva a considerar-se como vivendo já nos últimos tempos; a ideia veterotestamentária do povo de Deus, interpretada apocalipticamente, forma a base da sua primeira cristología, etc. 17 Em resumo, as origens desta apocalíptica postpascual não seriam outras que a interpretação pelos discípulos da profunda experiência pascual mediante as categorias herdadas da apocalíptica judaica. 

b) Os entusiastas de Corinto 

O desenvolvimento posterior desta apocalíptica postpascual o descreve Käsemann empregando como antítese o entusiasmo helenístico tipificado na Igreja de Corinto, e como síntese, na que parte dos elementos são recuperados de novo, o pensamento de Paulo. 

Vistas as características da apocalíptica postpascual, seu crescimento ficou por força limitado ao âmbito de influência das crenças messiânicas de origem palestina; em definitiva, se tratava de uma flor que não admitia transplantes. Uma vez que a Igreja se abriu aos gentis, sua posição ficou condenada a ser cada vez mais minoritária. Fora do âmbito palestino, o cristianismo foi compreendido como uma religião mistérica, e a teologia da apocalíptica postpascual ou foi negada ou foi reinterpretada de maneira diferente. Entre os elementos que são profundamente reinterpretados, Käsemann assinala, por exemplo, os seguintes 18: 

– O tema dos dois éons, que se sucedem temporalmente, é compreendido como uma contraposição atemporal dos dois mundos, e o tema da passagem do um ao outro é reinterpretado em termos antropológicos, concentrando-se nas diferenças entre o homem novo e o homem velho mais que nas diferenças entre o tempo presente e o tempo futuro. 

– Esta perda de temporalidade afeta igualmente ao ser salvo; como um drama mistérico com distintas fases, a Encarnação é vista como uma humilhação, ela Preexistência é considerada como o começo do processo de salvação ao que o crente é associado e em cujas distintas fases participa. 

– A concepção do Cristo elevado aos céus e escondido à destra de Deus é transformada na concepção do Cristo exaltado, entronizado como Senhor do mundo e que tem submetido a si próprio todas as potestades; a comunidade, como Corpo de Cristo, deve estender-se pelo mundo inteiro, como uma nova criação, para expressar este senhorio. 

– Em um contexto de religião mistérica, o batismo é visto como um fato central salvífico e toda a existência terrena é compreendida como uma representação temporal da existência celestial. O batismo é radicalmente interpretado: os salvos têm morrido com Cristo e com ele têm sido entronizados. A ressurreição dos mortos é algo que se considera já sucedido; desde que participantes na crucifixão de Cristo, os crentes participam igualmente na sua ressurreição e entronização e se acham assim já livrados do poder da morte e introduzidos no Reino de Cristo. 

– O dualismo da apocalíptica é transformado em um dualismo metafísico de corte antropológico que permite separar aos salvos dos que não têm sido e compreender a recepção do Espírito como uma nova criação, e dado que esta nova criação é de origem celestial, elimina todas as diferencias: já não há grego nem judeu, servo nem homem livre, homem nem mulher! 

Mas a transformação mais profunda (como sublinha Käsemann respondendo à crítica de E. Fuchs 19) tem se operado a nível da escatologia; a escatologia futura da apocalíptica tem sido transformada em uma escatologia presente em sentido estrito 20. Para os coríntios, o final da história já tem chegado 21. A comunidade de Corinto tem interpretado tão radicalmente a experiência batismal de morte e ressurreição com Cristo, que se considera já partícipe da vida celestial no tempo presente. A espera da parusia, o tema central da apocalíptica postpascual, já não faz sentido 22. 

c) A síntese paulina 

Esta negação da essência da apocalíptica postpascual, no entanto, não será a resposta definitiva no interior da Igreja primitiva. Käsemann crê descobrir uma nova fase de síntese, na que certos elementos da apocalíptica postpascual são recuperados na teologia de Paulo. 

Em uma forma que poderíamos designar como hegeliana, Käsemann ressalta os elementos nos que a teologia de Paulo oferece uma síntese de ambas tendencias 23, começando por sua escatologia do “já, mas ainda não”, sua visão do presente não como o fim da história, mas como o começo da época do fim, quer dizer, por sua combinação de escatologia futura da apocalíptica com a escatologia presente tipificada na comunidade de Corinto. Para Käsemann, a autoconsciência apostólica de Paulo só é compreensível à luz da apocalíptica. Diante da interpretação predominante desde a Reforma (e em polémica com Ebeling e Fuchs) que vê na doutrina de Paulo sobre a Lei e a Justificação sobre todo uma polêmica antijudaica, Käsemann ressalta os elementos de polémica ante entusiástica, conduzida sob a bandeira da apocalíptica, presentes nos seus escritos e aparentes sobre todo na sua antropologia. É característica neste sentido a precisão que Paulo aporta à concepção da participação pelo batismo na crucifixão e na ressurreição de Cristo ao falar em futuro e não em perfeito da participação à ressurreição; o batismo antecipa, da esperança, mas não dá ainda a mesma vida futura. Igualmente característica é a interpretação que 1 Cor 15,20-28 dá da ressurreição não em uma perspectiva antropológica, mas cristológica, e onde Paulo faz da escatologia presente dos entusiastas a base da escatologia futura da apocalíptica. Outros dos elementos nos que Paulo sintetiza o pensamento da apocalíptica seria seu emprego de Basileia Christi (<<reino de Cristo”) para designar o futuro escatológico, sua descrição do Senhor não como Kultherrn (<<senhor invocado no culto”), mas como erbobten Kosmokrator (<<cosmocrator exaltado aos céus”), seu emprego técnico dos termos “espírito” e “carne” para referir-se aos poderes cósmicos que dominam sobre o homem e lhe submetem a suas esferas de domínio e que refletem o dualismo apocalíptico. A mesma concepção paulina da justificação, a tensão entre o já Erslostsein und dem noch nicht Gesichertsein (<<estar já redimido, mas ainda não seguro”), a dialética entre o indicativo e o imperativo paulino, seriam um reflexo desta síntese dos elementos entusiásticos e apocalípticos. 

d) Conclusão 

Na hipótese de Käsemann, a síntese paulina haveria assegurado à apocalíptica postpascual a perenidade dentro do sistema teológico que terminará por se impor dentro do cristianismo. A matriz haveria dado à luz à teologia cristiana. Mas, o que aconteceu com a mesma matriz? Em que ficaram as comunidades da fronteira sírio-palestina nas que a apocalíptica postpascual se forjou e se desenvolveu? O final da história é para Käsemann tão obscuro como o começo. O fato é que essas comunidades desapareceram da história e com elas essa apocalíptica. O motivo desta desaparição o encontra Käsemann na demora da parusia. Ao prolongar-se a espera do retorno do Filho do Homem, o entusiasmo que motivou esta apocalíptica perdeu sua força. Esta espera que não virou realidade constituiu o ocaso da apocalíptica. A apocalíptica postpascual, que havia começado como uma minoria judeu-cristiana ao interior da Igreja, viu-se reduzida posteriormente a uma seita e terminou por desaparecer da cena, mas não sem antes haver influenciado profundamente em todo o desenvolvimento da posterior teologia cristiana. 

A conclusão de Käsemann merece ser citada por inteira: 

“Temos de constatar sem rodeios que esta esperança tem secado e que com ela tem fracassado ao mesmo tempo a inteira concepção teológica da apocalíptica postpascual, com sua espera da parusia, cujo centro se encontrava na reunificação das doze tribos, e também com sua luta pela lei mosaica e contra a prática da missão aos gentis, Mas também temos seu caminho, que leva da Pascoa à Teologia através primeiro de uma minoria judeu-cristiana, através depois de uma seita ao interior da grande Igreja, e que desaparece finalmente deixando somente rastros literários 24. 

CRÍTICA A KÄSEMANN 

Com o resumo precedente acredito ter dado uma apresentação respeitosa e objetiva da hipótese de Käsemann. A seguir exporei os principais pontos que me impedem aceitar esta hipótese. Certamente, é impossível discutir aqui os grandes pressupostos que servem de base à hipótese de Käsemann, tanto a nível da crítica das formas e da crítica literária do Novo Testamento como a nível da teologia subjacente a toda sua hipótese. Minha crítica tenta situar-se no mesmo plano de trabalho de Käsemann e parte, portanto, não dos pressupostos teóricos implícitos, mas de suas afirmações concretas. Minha crítica se centrará nos pontos seguintes: 

– Definição de apocalíptica. 

– Importância da espera da parusia. 

– Jesus não-apocalíptico. 

– Reconstrução histórica. 

a) Definição de apocalíptica 

A primeira observação que deve fazer-se a esta hipótese de Käsemann (e esta foi uma das primeiras objeções que se lhe fizeram) é que parte de uma concepção particular da “apocalíptica”. É enormemente revelador o que no seu primeiro artigo Käsemann não sentiu a necessidade de definir o que é 10 que ele entendia por apocalíptica. Toda uma série de expressões supõem que para ele, como para seus leitores, o conceito de apocalíptica é uma coisa evidente. Ainda mais, seu frequente emprego sem qualificações de “apocalíptica” sugere que se trata de um fenômeno homogêneo onde se confundem elementos provenientes da apocalíptica do Antigo Testamento: a do judaísmo tardio, a representada pela comunidade qumrânica, etc., e o que ele designa como apocalíptica cristiana postpascual. Mas, como observa Ebeling, parodiando uma das frases de Käsemann, “há que distinguir entre apocalíptica e apocalíptica” 25. 

Unicamente no seu segundo artigo, é movido a isso pela crítica de Ebeling sobre o problema terminológico, Käsemann se sentiu obrigado a precisar que para ele “apocalíptica” é “a espera iminente da parusia”, quer dizer, “a forma especial de escatologia que trata do final da história” 26. Esta tentativa de definição nos precisa claramente que Käsemann emprega em sua tese a palavra “apocalíptica” com um significado muito particular; “apocalíptica” não tem nada que ver com o gênero literário de “apocalipse” nem com as obras, judias ou cristianas, geralmente consideradas como apocalipse, nem também não com o contexto social onde o fenómeno do apocalipticismo se desenvolve ou com as expressões literárias nas que este fenômeno se traduz, mas que se utiliza unicamente como designação de um motivo teológico determinado presente na comunidade cristiana primitiva, uma das formas da sua escatologia, a saber: a espera iminente da parusia. É muito significativo neste sentido o que nos longos artigos de Käsemann não encontremos (salvo uma referência isolada às aclamações do Apocalipse de João) nenhuma alusão às obras consideradas como apocalipse, nem também nenhuma referência que justifique o considerar como “apocalípticas” determinadas ideias ou expressões. Para Käsemann, “apocalíptica” é simplesmente a forma de cristianismo primitivo caracterizada pela espera do retorno iminente de Jesus. Evidentemente, esta apocalíptica cristiana primitiva é considerada por Käsemann como uma prolongação da apocalíptica judaica; a dizer com suas próprias palavras: ela “se alimenta teologicamente da tradição apocalíptica judia”. Mas a verdadeira apocalíptica judaica fica fora do campo de suas considerações, e o problema de se existir uma apocalíptica cristiana como fenómeno distinto da apocalíptica judaica, e neste caso quais são os elementos que permitem diferenciá-las, ou se os textos apocalípticos cristianos primitivos não são mais que uma expressão da apocalíptica judaica, não é nem sequer abordado. Pondo com crueza o problema, poderemos perguntar-nos: é legítimo reduzir a apocalíptica a este único elemento teológico? A resposta é óbvia: a utilização de “apocalíptica” neste sentido só serve para alimentar a confusão. 

No contexto protestante onde Käsemann escreve e na época na que aparecem seus artigos, a palavra “apocalíptica”, o mesmo que o outro termo chave que ele utiliza, o “entusiasmo”, tinham umas conotações provocativas evidentes, o que pode explicar-nos seu uso e o boato provocado pela sua tese. Mas isto não implica que seu uso seja justificado. É significativo que na sua reação, Bultmann, depois de marcar algumas diferenças de detalhe e uma distinta interpretação da antropologia paulina, se limite a reformular a abordagem substituindo apocalíptica por escatologia: “… na minha opinião, pode se dizer que a escatologia é a mãe da primitiva teologia cristiana, mas não a apocalíptica” 27.

b) Centralidade da parusia 

Devemos, pois, separar o problema observado por Käsemann da terminologia por ele utilizada e perguntar-nos se a expectativa da iminente parusia é a matriz da teologia cristiana, quer dizer, se a expectativa da parusia na primitiva comunidade tem a centralidade que Käsemann lhe assigna. 

Minha resposta é dupla: por una parte deve afirmar-se que a expectativa da parusia está bem presente no Novo Testamento, e não somente a nível da primeira comunidade cristiana à que Käsemann atribui o Evangelho de Mateus ou a nível dos Fatos dos Apóstolos) mas também na teologia de Paulo, nos ditos da fonte “Q” e do Evangelho de Marcos e na mesma pregação de Jesus de Nazaré, mas ao mesmo tempo deve reconhecer-se que esta expectativa não tem a centralidade que Kásemann lhe assigna. 

É fácil de provar o primeiro elemento de mi resposta; para isso é suficiente acrescentar às referências proporcionadas por Käsemann, e ao grito del “Maran atha”, o final do discurso de Pedro em Hch 3,19-21, o ensinamento de Paulo na 1 Tes, os ditos sobre a vinda do Filho do Homem conservados na fonte Q, ou a textos como Me 9,1: “Os digo de verdade: há alguns dos que estão aqui que não provarão a morte sem ver antes o reino de Deus, vindo com poder”, ou a conclusão da parábola da figueira (Me 13,30): “Os digo de verdade: não desaparecerá esta geração sem que tudo isto se realize”. Agora bem: se a expectativa da parusia não é um evento postpascual, sino que se remonta aos níveis más antigos, se acha disseminada por todo o Novo Testamento e enlaça com a pregação do Jesus histórico, dificilmente pode se fazer dela o ponto de ruptura e a chave de interpretação apocalíptica da mensagem de Jesus. 

O segundo elemento da minha resposta (que a expectativa da parusia não tem o caráter central que Käsemann lhe atribui) é mais complicado e, de certa forma, mais subjetivo, precisamente porque eu parto do fato de que a expectativa da parusia se encontra presente em todos os níveis do Novo Testamento e porque a avaliação da importância é uma questão de apreciação. E, porém, há um par de fatos objetivos que creio que deixam bem claro que esta expectativa não se situa no centro, mas bem em direção à periferia do pensamento cristiano primitivo. 

O primeiro é que nas expressões mais antigas do querigma cristiano que têm sido transmitidas (como 1 Cor 15,3-5 ou Rom 10,9-10) o tema da expectativa da parusia não aparece; nestas antigas confissões de fé o elemento central é a morte, sepultura, ressurreição e aparições de Jesus, não a futura vinda do Filho do Homem. Como diz E. Lohse 28: “Está claro que a origem da teologia cristiana não se encontra na apocalíptica -nem na expectativa judaica nem no entusiasmo cristiano primitivo–, mas repousa no querigma que predica ao Cristo crucificado como o Senhor ressuscitado. A tese de Käsemann … não recebe confirmação das mais antigas expressões da pregação cristiana ou na confissão da Igreja primitiva. A origem e o centro da teologia cristiana se situa desde o começo no mundo da cruz”. 

O segundo fato, igualmente objetivo, é que as numerosas referências a la expectativa da Parusia disseminadas em todo o Novo Testamento são como de passada; quando Paulo, ou o autor de 2 Tessalonicenses, discute o tema da Parusia especificamente (em 2 Tes 2,1-12) é para corrigir a ideia de que se trata de algo iminente, enquanto que outras discussões da escatologia nas que a expectativa da Parusia aparece (como em 1 Tessalonicenses o em 1 Coríntios) o problema central ali tratado é o da ressurreição. As menções dentro da tradição sinóptica contêm um duplo elemento: exortar a estar preparados à vinda do dia do Senhor por uma parte, e evitar dar a impressão que esse dia já tenha chegado; o que dificilmente pode considerar-se como a maneira de enunciar um tema realmente central 29. 

Em consequência, se a espera da Parusia não tem a centralidade que Käsemann le atribuye en o pensamento da primeira comunidade cristiana, se ela além do mais se encontra já presente desde o começo na pregação mesma de Jesus, no es possível atribuir a esta esperança a função que Käsemann lhe assigna de peça chave, no que diz respeito ao elemento que transforma e modifica apocalipticamente a mensagem de Jesus e o converte na primeira teologia cristiana. 

c) Um Jesus não apocalíptico 

Outra das falhas essenciais da hipótese de Käsemann, brevemente antecipado no já dito e que aparecerá de uma forma muito mais clara na terceira parte de mi exposição, é a ruptura que ele supõe entre uma pregação de Jesus, que não seria em modo algum apocalíptica, e a interpretação apocalíptica postpascual de sua mensagem. Sem pretender entrar aqui no problema das relações entre a fé pascual e o Jesus histórico, entre o Jesus predicador e o Cristo predicado, e com o único objetivo de apontar a debilidade deste ponto fundamental na hipótese de Käsemann, é suficiente marcar que o mesmo Käsemann se vê obrigado a reconhecer que: “Mediante a designação de Jesus como seu Senhor e como o Filho do Homem que devia retornar e mediante esse saber-se enviada” no seu nome”, a comunidade primitiva se atribuía a si própria uma continuidade histórica e real. Isto só pode significar que a escatologia, cristologia e eclesiologia postpascuais se acham ligadas à mensagem e à atividade de Jesus” 30. Esta confissão mina todo o terreno sobre o qual Käsemann constrói e suprime as bases da sua antítese. Mas como historiador, Käsemann se vê obrigado a reconhecer a existência desta continuidade e  aceitar implicitamente um Jesus tão apocalíptico pelo menos como a escatologia, cristologia e eclesiologia postpascuais que dependem de sua mensagem e de sua atividade. Depois de tudo, me parece impossível negar que Jesus anunciou a vinda iminente do Reino de Deus, cujos efeitos apareciam já nas suas próprias obras, com a mesma força que o Batista, cujo apocalipticismo Käsemann afirma com força; o mesmo que me parece impossível negar que ele antecipou o final dos tempos indicando inclusive o período atormentado que deve preceder-lhe y que é conhecido na tradição apocalíptica como o “período das dores de parto do Messias”. 

d) Reconstrução histórica 

O último ponto da minha crítica se centrará em alguns elementos da reconstrução histórica do desenvolvimento dessa apocalíptica postpascual que não me parecem conformes com os textos.

Käsemann tem razão ao ressaltar a divisão ao interior da primitiva comunidade cristiana, mas a questão e se essa divisão se perfilou segundo as linhas que ele indica: uma rigorosa comunidade judeu-cristiana, representante da apocalíptica postpascual de uma parte, e o grupo de Estevão e os sete, partidário da missão aos gentis e representante dos entusiastas, da outra. Käsemann apela às informações dos Fatos dos Apóstolos para precisar a história sucessiva do conflito 31, mas um exame atento dos textos não parece sustentar suas conclusões. Käsemann põe em relação a apocalíptica postpascual, à que caracteriza como “rígido judeu-cristianismo” e como “rabinato cristiano”, com os Doze (cujas posições teológicas como grupo nos são praticamente desconhecidas), com Pedro (a quem não parecem poder aplicar-se, apesar da sua contemporização com os judeu-cristianos, na medida na que aceita e se incorpora à missão aos gentis) e com Santiago (o único dos personagens que de algum modo poderia quadrar com a descrição no que diz respeito ao chefe reconhecido da “igreja da circuncisão”).

Também não sua assimilação do grupo dos “entusiastas” com Estevão e os sete parece mais afortunada, pelo menos no que diz respeito ao ponto fundamental da missão aos gentis, já que, como ressalta Rollins 32, Hch 11,19 nos precisa que quando o grupo de Estevão se dispersa depois do seu martírio, seus membros “foram até Fenícia, Chipre e Antioquia, sem expor a palavra a ninguém, a não ser unicamente aos judeus”; é verdade que o verso seguinte afirma: “Alguns deles eram cipriotas e de Cirene, e esses, ao chegar a Antioquia, falavam também aos gregos, predicando o evangelho do Senhor Jesus”, mas em qualquer caso a união de ambas afirmações nos assegura que o elemento da missão aos gentis não pode ter sido o ponto de conflito entre o grupo formado em torno a Estevão e a apocalíptica postpascual. 

Outro elemento da sua reconstrução histórica que é problemático é a centralidade que atribuía Jerusalém no processo e que não deixa espaço para a dimensão galileia do cristianismo postpascual, dimensão que em Mateus, Marco y João é tão importante como a dimensão jerosolimitana de Lucas-Fatos.

Tampouco sua localização destas comunidades na fronteira destas comunidades sírio-palestina, depois do martírio de Estevão, a separação do Pedro de Jerusalém, ou da guerra contra Roma, ainda que historicamente verossímil, me parecem testemunhadas nos textos.

Como também não encontro testemunhada nos textos a desaparição desta apocalíptica judeu-cristiana ao retrasar-se a Parusia. Em qualquer caso, o judeu-cristianismo, com seu Torá-centrismo, suas exigências de pureza e sua oposição à Igreja da gentilidade, seguiu vivo no solo palestino durante vários séculos, muito tempo depois da suposta desaparição da apocalíptica postpascual. Em definitiva, o tipo de cristianismo que Käsemann descreve como o lugar de origem da primeira teologia cristiana e a matriz de toda a teologia posterior, se é que alguma existiu como realidade histórica, longe de ser o centro do primitivo cristianismo não parece ser, no máximo, mais do que uma das muitas faces nas que a mensagem de Jesus e a experiência pascual foi traduzida e cujas marcas podem ser rastreadas no interior do Novo Testamento

A APOCALÍPTICA JUDAICA COMO MATRIZ DA TEOLOGIA CRISTIANA 

As considerações precedentes provam, na minha opinião, que a tese, tal e como a formulou Käsemann, é inaceitável. A apocalíptica cristiana postpascual não é a matriz na que se tem desenvolvido toda a teologia.

32 “The New Testament and Apocalyptic”, NT5 17 (1970-71) 454-476, na p. 468. 

192 A APOCALÍPTICA JUDAICA COMO MATRIZ DA TEOLOGIA CRISTIANA?

A tese de Käsemann é fruto do seu tempo, e desde a perspectiva da nossa época é fácil apreciar suas falhas. Mas a pergunta à que Käsemann aponta: seu desejo de encontrar essa matriz fecunda da que se deriva a teologia cristiana segue sendo válida e premente. Daí que esta terceira parte de minha comunicação esteja destinada a precisar em qual sentido podemos falar hoje da apocalíptica judaica como matriz da teologia cristiana.

Minha resposta a esta interrogante é, em definitiva, positiva. E, de certa forma, ainda mais radical que a resposta de Käsemann, embora ao mesmo tempo mais matizada e menos exclusiva e polêmica. Mais radical, posto que não supõe uma mensagem primeira não apocalíptica, reinterpretada apocalipticamente depois, mas aceita plenamente que Jesus é filho do seu tempo e que sua mensagem se encontra desde os inícios imbuído das ideias da tradição apocalíptica judaica da sua época. Mais matizada, posto que não se vê nas ideias provindas da tradição apocalíptica a explicação de toda a teologia Cristiana posterior, mas um dos seus componentes essenciais.

Minha resposta pode formular-se assim: a tradição apocalíptica judaica (como a tradição profética e a tradição sapiencial) é um dos componentes essenciais do pensamento do Jesus histórico, da teologia paulina e de toda teologia Cristiana. Na minha opinião, o influxo da tradição apocalíptica judaica não se introduz no pensamento Cristiano como uma reação postpascual à mensagem evangélica, mas se encontra presente desde os começos da pregação de Jesus e condiciona assim, todos os desenvolvimentos teológicos posteriores. Neste sentido pode falar-se da tradição apocalíptica como a matriz da teologia cristiana, da mesma forma da que pode falar-se da tradição apocalíptica como a matriz da teologia qumrânica, por utilizar um paralelo do meu próprio campo de trabalho. O cristianismo, como a seita de Qumrán, começou como uma seita apocalíptica no interior do judaísmo, e posto que a questão sobre a matriz é na realidade uma questão sobre as origens, podemos afirmar que a tradição apocalíptica judaica foi a matriz da teologia cristiana. 

Para poder precisar minha resposta e compreender as diferenças com a tese de Käsemann que tenho resumido e criticado, eu precisarei a seguir, o que entendo por apocalíptica judaica, e tentarei mostrar logo como distintos elementos provenientes desta tradição apocalíptica aparecem na pregação do Jesus histórico e entram assim a fazer parte de toda teologia cristiana. 

a) A tradição apocalíptica 

Comecemos, pois, por explicar o que se entende hoje (trinta anos depois do artigo de Käsemann) por apocalíptica judaica. 

Afortunadamente, existem boas apresentações do fenômeno, como o panorama geral do professor A. Piñero, que contem, também, uma excelente bibliografia, o que me permitirá ser relativamente breve 33. 

A concepção nebulosa e imprecisa da apocalíptica que reflete o artigo de Käsemann é característica da sua época e de uma compreensão da apocalíptica na que predominava a combinação dos distintos elementos de conteúdo que podem  focar-se dos distintos apocalipses (dentre os que predominava a escatologia) com a adição de alguns elementos formais da linguagem apocalíptica, a nota fazia possíveis elementos sociológicos, como os “conventículos” ou grupos marginais nos que a apocalíptica teria se desenvolvido, etc., e que permitia praticamente a cada autor (dependendo do elemento que se considerar como predominante) ocultar sob o nome de “apocalíptica” qualquer realidade ou qualquer ideologia. Esta forma imprecisa e nebulosa de definir a apocalíptica culmina em 1970 com o livro de K. Koch, cujo título expressa adequadamente a posição de desamparo da pesquisa diante do fenômeno da apocalíptica: Ratlos vor der Apokalyptzk 34. Com esta obra começa um período de reação no qual se tenta sair dessa compreensão nebulosa e imprecisa para chegar a uma definição mais concreta do que é a apocalíptica. Esta reação dura até 1979, data em que aparecem simultaneamente um artigo de J. Carmignac 35 e o número 14 da Semeia, editado por J. J. Collins, com os resultados da pesquisa do Apocalypse Group da SBL Gentes Project 36, e se celebra em Upsala um grande congresso internacional dedicado à apocalíptica 37. A consequência  desta reação é clara: a partir desse momento se separa a forma do conteúdo e se oferece da apocalíptica uma definição que reduz o fenômeno a puro gênero literário. Formulando cruamente esta reação, poderíamos dizer: a apocalíptica não existe, existem apocalipses, que são obras literárias com certas características formais comuns que permitem defini-las como pertencentes al género literário apocalíptico; a sistematização destas características poderia em rigor definir-se como apocalipticismo, pero o uso de “apocalíptica” para designar uma determinada escatologia, ou messianismo, ou qualquer outra “ideia”, estaria fora de lugar. Do pan-apocalipticismo dos anos sessenta se passa à eliminação da apocalíptica nos anos setenta. 

Afortunadamente, já durante o mesmo congresso de Upsala e nas publicações posteriores dos anos oitenta tem se aberto caminho uma nova compreensão da apocalíptica, que é a predominante hoje em dia e a que aqui utilizamos. Esta concepção aceita uma boa parte dos resultados depuradores e esclarecedores que o esforço por definir a apocalíptica e o género literário “apocalipse” tem produzido, e que assume o rigor terminológico que os trabalhos precedentes têm imposto. Mas ao mesmo tempo, não se resigna à redução da apocalíptica a um simples gênero literário, convicta de que sem a apocalíptica não é possível compreender os apocalipses. Em definitiva, se o Livro dos Vigilantes, o Livro dos Sonhos e a Epístola de Enoc, três verdadeiros apocalipses de origem e de época diversa, puderam já no século 1 a.e. ser recolhidos e integrados na unidade superior que é o Livro de Enoc, que nós conhecemos, e que é, por sua vez, um verdadeiro apocalipse, isto foi possível porque essas três obras refletiam, apesar das diferenças, uma mesma linha de pensamento, porque eram herdeiras de uma mesma tradição, e não porque as três pertenciam a um mesmo género literário que, como tal, era completamente desconhecido.

Esta concepção da apocalíptica tem se desenvolvido ao longo de duas linhas de pesquisa: uma tipificada por P. Sacchi 38, interpreta a apocalíptica em uma perspectiva histórica e traça a evolução das suas ideias chaves e seu desenvolvimento mediante a interação com outras linhas de pensamento do judaísmo da época; a outra, representada por 1. Hartman e D. Hellholm 39, desenvolve uma aproximação sintagmática e tenta precisar a função sociolinguística dos textos e iluminar em qual sentido a forma mesma é transmissora de conteúdo. 

Nesta concepção, que é a que eu aqui utilizo, a apocalíptica é uma linha de pensamento que nasce no contexto religioso e cultural concreto do judaísmo pós-exílio, que se desenvolve durante um longo período de tempo reagindo interativamente com outras linhas de pensamento do meio-ambiente judeu, como a tradição profética ou a tradição sapiencial, e que se plasma nas distintas obras que designamos como “apocalipses”. Esta linha de pensamento devia ser o suficientemente complexa para poder engendrar obras tão diversas como são os distintos apocalipses e o suficientemente poderosa como para conseguir que um dos seus produtos representativos, uma boa parte do livro de Daniel, conseguisse ser aceito no cânon da Escritura. 

No interior desta tradição apocalíptica judaica, cujas principais fases de desenvolvimento podemos agora seguir desde seu primeiro produto literário conservado (o Livro dos Vigilantes) até seus representantes de finais do século 1 d.C. (como IV Esdras ou JI Baruc) se desenvolvem certas ideias características, como a explicação da origem do mal no mundo como resultado da intervenção de um agente angélico, o determinismo, o domínio sobre o mundo das forças do mal e a destruição final destas forças pelo juízo divino, a passagem de uma estrutura meta-histórica a uma estrutura histórica e a periodização da história, a comunhão com o mundo angélico, o tema da mediação entre o homem e Deus e o desenvolvimento das figuras messiânicas, a resolução do problema da retribuição mediante a ressurreição, por não citar mais que algumas da longa lista que poderia compor-se. Estas ideias, é claro, não aparecem sempre sob a mesma forma nem se encontram todas e cada uma delas em cada apocalipse. Sobre todo, aparecem formuladas não com a nossa linguagem teórica e abstrata, mas em uma linguagem mito poética, imaginativa mais que descritiva, uma linguagem que mais que explicar a revelação que transmite tenta fazer participar da experiência visionária que reflete, uma linguagem que deve, portanto, ser respeitada, posto que é o veículo essencial dessa comunicação. 

b) Elementos apocalípticos na pregação de Jesus 

Deixando de lado conceitos centrais da pregação de Jesus cujas raízes na apocalíptica judaica são incontestáveis, como os conceitos de “Reino de Deus”, “Filho do Homem”, “Dia do julgamento”, etc, tenho escolhido três conceitos aos que geralmente não se presta demasiada atenção, como exemplos que nos mostram até que ponto a pregação de Jesus se encontra influenciada pelo pensamento apocalíptico, e sua “teologia”, pela “teologia” da tradição apocalíptica. Estes conceitos são: 

1) O mal no mundo 

Uma das ideias mais antigas da tradição apocalíptica é a atribuição da existência do mal no mundo à ação de um agente exterior à história e ao homem 40; somente na quarta fase da apocalíptica, e como reação sem dúvida ao perigo de dualismo que esta explicação implica, a origem do mal se situará na cor malignum, o yetzer ra ‘a do IV Esdras. Da união dos anjos caídos com as filhas dos homens no Livro dos Vigilantes ao príncipe Mastema de Jubileus ou aos “anjos das trevas” e a Melki-resha de Qumrán, a Belial ou ao Satã dos evangelhos, a origem da existência do mal e sua presença e domínio sobre o homem está ligado a estas figuras sobre-humanas. Dentro da tradição apocalíptica, este tema está intimamente unido com o da futura destruição do mal, com o trunfo final de Deus e o castigo definitivo dos causadores do mal. 

O mesmo esquema aparece na pregação de Jesus. Como para a tradição apocalíptica, para Jesus o mal no mundo é ante tudo uma personificação das forças demoníacas; como para a tradição apocalíptica, também para Jesus o resultado final da batalha contra o mal está assegurado de antemão e se concluirá com a vitória de Deus. A diferença mais notável é que para Jesus, esta destruição tem começado já de certa forma com sua própria atuação, daí que suas curas e expulsões de demônios são vistas como um começo deste trunfo sobre o mal. Quando Jesus diz: “Eu estava vendo ao adversário, que caia do céu como o raio” (Le 10,18), ou: “Agora é a condena deste mundo; agora o chefe deste mundo vai ser expulsado fora” (Jn 12,31), nos diz que Deus tem quebrado já a força do mal e tem começado sua marcha vitoriosa neste mundo. Ainda que, como nos 10 indica a última petição do pai-nosso: “mas livra-nos do mal” (Mt 6,13), a vitória definitiva se vê ainda em uma perspectiva distante e a vida dos discípulos se segue compreendendo como uma luta sem quartel contra este mal.

2) A escatologização das palavras dos profetas

Um dos elementos essenciais da tradição apocalíptica é a reinterpretação da Escritura à que se chega por revelação. Da reinterpretação de Jeremias que Gabriel dá a Daniel à reinterpretação de Daniel que Uriel oferece a Esdras, passando pela reinterpretação da Torá de Ezequiel que encontramos na Nova Jerusalém, podemos afirmar que esta reinterpretação é uma das constantes da tradição apocalíptica. O melhor exemplo deste tipo de reinterpretação o encontramos dentro da comunidade Qumrânica, onde todo o texto dos Profetas é reinterpretado escatologicamente em virtude da revelação recebida e aplicado diretamente à realidade presente da comunidade, que é vista como a realidade dos “últimos tempos” 41. É o que nos ensinam os pesharim (<<interpretações”) qumrânicos e todas as demais citas dos profetas que aparecem interpretadas nos escritos sectários. Esta reinterpretação chega até o ponto de afirmar que o verdadeiro sentido do texto no tem sido realmente compreendido pelo profeta original, e que seu significado profundo só pode ser compreendido à luz da revelação recebida ao interior da comunidade: 

e Deus disse a Habacuc que escrevesse o que havia de suceder à geração última, mas o final da época não lhe foi dado a conhecer. E o que diz: Para que corra quem o leia, sua predição se refere ao Mestre de Justiça, para quem Deus tem manifestado todos os segredos dos seus servos os Profetas (lQpHab VII, 1-5). 

Esta mesma escatologização do texto profético se encontra presente na reinterpretação que Jesus oferece. Assim, no seu primeiro discurso em Nazaré, termina a leitura de Is 61 com a constatação: “Hoje tem se cumprido esta escritura perante este auditório” (Le 4,18-21). O que equivale a dizer: o verdadeiro significado do texto de Isaías não se refere à circunstância histórica de que trata o profeta, mas se refere ao presente que eu represento. A mesma interpretação se encontra na resposta que Jesus dá ao enviado do Batista: “Os cegos recobram a vista, os mancos andam … “ (Mt 11,2-6; Le 7,18-23), com a que mostra que o anúncio dos profetas se considera já realizado. Estes e outros exemplos que poderiam multiplicar-se nos mostram que Jesus, como a tradição apocalíptica, se aplica a si próprio e a seu presente, compreendido como “o final dos tempos”, as palavras dos profetas bíblicos. 

3) O presente como “o final dos tempos” 

Este é o terceiro dos elementos que gostaria de abordar. Na pregação de Jesus, como na tradição apocalíptica, o presente é visto como “o final dos tempos”, como o começo da observância de todas as promessas. O tema é de sobra conhecido como para precisar insistir nele, e uma boa parte dos textos que Käsemann cita podem ser usados para prová-lo. Minha ideia fundamental é que esta convicção não é simplesmente uma convicção postpascual, resultado da experiência da ressurreição de Jesus como primícia da ressurreição dos justos, ou da recepção do Espírito como introdução dos tempos messiânicos, mas que esta visão do presente como o lugar onde a batalha final contra as forças do mal já tem começado, do presente como o lugar onde se cumprem as promessas dos profetas, do presente como o começo do “reino de Deus”, etc., é um dos elementos característicos da pregação de Jesus, e que esta concepção provém da tradição apocalíptica judaica e da visão da história que ela introduziu dentro do judaísmo. 

Não creio que sejam necessários mais exemplos para fundamentar a afirmação que o influxo da tradição apocalíptica judaica é um dos elementos constitutivos da pregação de Jesus de Nazaré. E se esta tradição apocalíptica judaica tem influenciado profundamente na formação e na formulação desta mensagem, pode com razão considerá-la como a matriz da teologia cristiana, em um sentido distinto ao que Käsemann dava a sua tese, mas não por isso menos real. Mas antes de terminar este rápido percurso permitam ressaltar uma precisão metodológica aos efeitos de evitar maus entendidos. 

Do dito creio que se desprende claramente que a figura de Jesus se encontra ancorada, e bem ancorada, no húmus fecundo do judaísmo do seu tempo e que sua mensagem recolhe e incorpora um grande número de elementos da tradição apocalíptica. Minha apresentação das origens do cristianismo nascente como os de uma seita apocalíptica judaica dentre os outros vários grupos que conhecemos da mesma época é historicamente correta. Mas isto não quer dizer que o cristianismo, apesar desta continuidade histórica com a tradição apocalíptica, se reduza como fenômeno histórico à apocalíptica, nem que a teologia cristiana seja idêntica à teologia da apocalíptica. A divinização de Jesus é um fenômeno tão impensável dentro da tradição apocalíptica como dentro do resto do judaísmo e nos mostra claramente a existência de uma ruptura profunda entre a teologia cristiana e as teologias judaicas. 

A insistência de Käsemann sobre as diferenças entre a pregação de Jesus e o cristianismo postpascual e a centralidade da experiência pascual é uma das maneiras possíveis de localizar o momento dessa ruptura entre o judaísmo e o cristianismo como nova religião. Outros têm situado essa ruptura no ponto que separa o ensinamento de Jesus da teologia de Paulo; para outros, finalmente, a ruptura se haveria realizado já a nível da autocompreensão do Jesus histórico. O problema historicamente fascinante e teologicamente fundamental de localizar esse ponto de ruptura, a partir do qual o cristianismo se auto compreende como uma nova religião, fica evidentemente fora da perspectiva deste trabalho.

NOTAS

(O presente documento é um produto escaneado) As notas NÃO estão revisadas.

1 Ernst Käsemann, “Die Anfänge christlicher Theologie”, Zeitschrift für  Theologuie und Kirche [ZThK] 57 (1960) 162-185. 

2 Ernst Käsemann, “Zum Thema der urchristlichen Apokalyptik”, ZThK 59 (1962) 257-284; “Paulus und der Frühkatholizismus” ZThK 60 (1963) 75-89. 

3 Die Anfänge, p. 180. 

4 O artigo foi reeditado em 1964, junto com os outros escritos de Käsemann sobre o tema, na sua obra Exegetische Versuche und Besinnungen II, pp. 82ss; foi traduzido ao inglês com o título “The Beginnings of Christian Theology”, em New Testament Questions of Today (Londres 1969) 82ss, e incluído no número especial de Journal of Theology and Church, editado por R. W. Funk, com o título de “Apocalypticism”, JTC 6 (1969)., junto con as peças mais importantes aportadas ao dossiê, como os artigos de G. Ebeling e de E. Fuchs aos que nos referimos mais à frente. Infelizmente, este número especial do ]TS, que contém, além dos artigos citados, importantes estudos sobre o tema de O. Betz e do editor Funk, não me resultaram acessíveis. Sim pude utilizar o estudo de W. G. Rollins “The New Testamenr and Apocalyptic”, New Test. Studies 17 (1970-71), 454-476, que analisa a obra, assim como o trabalho de l. H. Marshall, “Is Apocalyptic the Mother of Christian Theology?”, em G. F. Hawthorne e O. Berz (eds.), Tradition and lnterpretation in the New Testament (Grand Rapids-Gotinga: Eerdrnans-Mohr, 1987) 33-42, e a resposta de R Bultmann a Käsemann: “Ist die Apokalyptik die Mutter der christlichen Theologie?”, publicada originalmente no Festschrift für E. Haenchen, Apopboreta 64-69, e reimpressa em Exegetica (Tubinga: Mohr, 1967-) 476-482, E em K. Koch-J. M. Schmidt, Apokalyptik (Darrnstadt 1982) 370-376 (= Wege der Forschung 365). Minhas citações de Käsemann estão tomadas da publicação original em ZThK. 

5 “Meine eigene Behauptung geht dahin, daB die nachosterliche Apokalyptik die alteste Variation und Interpreration des Kerygma bezeichnet” (Thema 263, n. 1). 

6 “Ostern und der Geistempfang die Urchristenheit veranlaliten, die Predigt Jesu vom nahen Gott erneut apokalyptisch zu beanrworten und in gewisser Weise abzulosen” (An/ange 180). 

7 “Die Dinge liegen doch wohl so, daE Jesus zwar von der apokalyptisch bestirnrnten Tauferbotschah ausging, seine eigene Predigt aber nicht konstitutiv durch die Apokalyptik gepragt war, sondern die Unmittelbarkeit des nahen Gottes verkündigte- (Anfänge 179). Veja-se igualmente Thema 269-271, onde Käsemann ressalta as diferenças entre o Batista e Jesus. 

8 Uma eleição que não é acidental, mas que se encontra motivada pelas considerações críticas e porque Mateus, escrito na fronteira sírio-palestina e contendo tradições judeu-cristianas, pode “der Frühzeit naher kommen als andere (Anfiinge 163). 

9 A reconstrução seguinte resume as grandes linhas de Anfiinge 163-171. Convem ressaltar que o mesmo Käsemann é consciente de seu caráter hipotético: “Nachdrücklich sei betont, daf im folgenden eine Rekonstruktion versucht wird.” 

10 “Umgekehrt gilt, daf erst die Apokalyptik im Bereich des Christentums historisches Denken ermoglichre- (Pelo contrário, é válido também que foi a apocalíptica em primeiro lugar a que possibilitou o pensamento histórico do cristianismo) (Anfiinge 175). Traduzimos as citações das notas unicamente quando não se correspondem literalmente com o texto da conferência. (Nota do Editor’) 

11 Anfiinge 172-174, 176·78. 

12 “Dern apokalyptischen Gesetz der Umwertung alIer Werte in der Endzeit (Anfiinge 178). 

13 Anjange 184. 

14 “Das wohl schwierigste Problem stelIt sich gleich zu Anfang: Von wann ab gibt es im strengen Sinne christliche Apokalyptik.?” (O problema na verdade mais difícil se levanta imediatamente ao início: desde quando existe uma apocalíptica cristiana em estrito sentido?) (Thema 260). 

15 “Beides vereinen zu müssen, hieíie für mich, gar nichr mehr verstehen zu kónnnen” (O ter que unir ambas coisas seria para mim não poder compreender) (Anjan[!,e 180). 

16 “Von dieser merkwürdigen “Eschatologie” aus, für die sich alles Leben “im Angesichte Gottes” vol1zieht, ist doch wohl zu versrehen, daf Jesus, so viel wir zu sehen verrnogen, nichr getauft hat, keine Gemeinde als heiligen Rest und Kern des messianischen Gottesvolkes aufbaut und keine Toraverscharfung auBerhalb der Forderung des Gehorsams und der Liebe kennt” (A partir desta maravilhosa “escatologia”, para a qual toda a vida se complementa “diante de Deus”, se pode compreender perfeitamente o que Jesus -assim que podemos perceber- não sondasse, não fundasse nenhuma comunidade como resto santo, núcleo do povo de Deus messiânico, nem também não radicalizasse a lei exceto a exigência da obediência e do amor) iThema 262). 

17 Thema 262-265. 

18 Thema 272-278. 

19 Ernst Fuchs, “Über die Aufgabe einer christlichen Theologie”, ZThK 58 (1961) 245-267. 

20 “Sie tut es der Apokalyptik gegenüber mit dem einen, aber alles modifizierenden Unterschied, der im strengen Sinne “prasenrische Eschatologie” verursacht” ( … a respeito à apocalíptica, isto se realiza com uma única diferença, mas que tudo o modifica: a que origina a “escatologia presente” no mais estrito sentido) (Thema 274). 

21 “Hier liegt der tiefste Unterschied des nachosterlichen Enthusiasrnus van dem der Korinther, welche die Anfechtung überwunden zu haben meinen, den erlangten engelgleichen Zustand rühmen und ihn vielfaltig praktizieren. Für die Korinther isr das Ende der Geschichte gekomrnen” (Aqui radica a mais profunda diferença entre o entusiasmo postpascual e o dos coríntios, que pensam ter vencido todas as tribulações, que se gabam de ter alcançado um estado igual ao dos anjos e que o praticam de. múltiplas maneiras. Para os coríntios, tinha chegado o final da história) (Anfiinge 183). 

22 “So radikal faEt hellenistischer Enthusiasmus die in der Taufe gründende Aussage, daB die Erlosren mit Christus auferstanden und mit ihm im himmlischen Wesen inthronisiert worden seien. Naherwartung der Parusie ist da sinnlos geworden, weil alles van der Apokalyprik noch Erhoffte bereits verwirklicht erscheint” (Deste modo tão radical interpreta o entusiasmo helenístico a afirmação que tem seu fundamento no batismo, a saber: que os redimidos têm ressuscitado com Cristo e que têm sido entronizados com ele no céu. A esperança num final que comporta a parusia resulta assim sem sentido, já que tudo o que espera ainda a apocalíptica aparece como já realizado) (Thema 178). 

23 Thema 278-283. 

24 “Wir haben ohne Umschweife zu konstatieren, daf diese Hoffnung getrogen hat und daf mit ihr zugleich die gesamte theologische Konzeption nachosterlicher Apokalyptik mit ihrer Parusie-Erwartung, welche die Wiederaufrichtung des Zwolfstammevolkes zu ihrern Kern hat, aber auch mit ihrem Karnpf für die Mosaische Tora und gegen die Praxis der Heidenmission gescheitert isr. Es gibt auch jenen Weg, der von Ostern zur Theologie erst einer judenchristlichen Minorirat, dann einer Sekte in der Grofikirche führt und schlielslich, nur noch literarische Spuren hinrerlassend, ganz verschwindet” (An/linge 184). 

25 “Aber wie Käsemann mit Rechr beront, daB “zwischen Enthusiasrnus und Enthusiasmus … genau so wie zwischen Geist und Geist zu unterscheiden” sei, so ware nun doch rnir gleichem Rechr zu betonen, daf zwischen Apokalyprik und Apokalyptik zu unterscheiden sei” (Mas como tem abordado acertadamente Käsemann, “há que distinguir entre entusiasmo e entusiasmo, ao igual que entre espírito e espírito”, do mesmo modo e com igual razão haverá que ressaltar que deve distinguir-se entre apocalíptica e apocalíptica) (G. Ebeling, “Der Grund christlicher Theologie”, ZThK 58 [1961J 227-244, en la p. 235). 

26 <e .. befindet man sich in der Verlegenheit, für die besondere Arr der Eschatologie, die van der Endgeschichre sprechen rnochre, keinen eigen Terminus mehr zu haben. DaB auch Apokalyptik mehrdeurig bleibt, ist nicht zu bestreiten. Van welchem Terminus gilt das aber nicht? Aus dem Zusammenhang ergibr sich, daf ich van urchristlicher Apokalyptik fast durchweg spreche, um die Naherwartung der Parusie zu bezeichnen” ( … se encontra um num impasse, [que] para essa classe especial de escatologia, que trata do final da história, não se possui um termo adequado. Que a apocalíptica fica assim como um [termo] ambivalente não se pode discutir. De que vocábulo no haverá que dizer o mesmo? Do contexto se deduz que quase sempre falo da apocalíptica cristiana primitiva para designar a iminente espera da parusia) (Thema 258, n. 2). 

27 R. Bultmann, “Ist die Apokalyptik die Mutter der chrístlichen Theologie?”, Apopbo-eta 69. 

28 E. Lohse, “Apokalyprik und Chrisrologie”, Zeitscb. f die neutest. Wissens. 62 (1971) 48-67, cita en la p. 58. 

29 Se eu tivesse que selecionar um elemento central dentro do pensamento escatológico do Novo Testamento (o que é algo muito diferente de sugerir que esse elemento é a origem da teologia cristiana), diria talvez que é a consciência de viver nos últimos tempos motivada pela experiência da ressurreição de Jesus e da recepção do Espírito; mas, afortunadamente, esta não é a tarefa que aqui tem-me sido encomendada. 

30 “Inden die Urgemeinde Jesus als ihren Herrn und als künftigen Menschensohn bezeichnete und “in seinem amen” sich gesandt wulste, hat sie historische und sachliche Kontinuitat für sich beansprucht. Das kann nichts anderes heillen, als daB nachosrerliche Eschatologie, Christologie und Ekklesiologie mit Jesus Botschaft und Werk verbunden werden” (Thema 269-270). 

JI Anrdn~e 168-169. 

  • A. Piñero, “A apocalíptica dentro da literatura intertestamentária. Panorámica general, I1 Simpósio Bíblico Espanhol (Valencia-Córdoba 1987) 591-602. No vol. 1 da série Apócrifos del Antigo Testamento (Madri 1984) 45-48, A. Díez-Macho oferece uma visião sintética do problema. Eu mesmo tenho me ocupado repetidamente do problema desde a perspectiva dos textos qumrânicos; veja-se F. García Martínez, “Encere l’Apocalyptique”, [ourn. 01 the Study 01 [udaism 17 (1986) 224-232; íd., “A apocalíptica e Qumrán”, TI Simposio Bíblico Español, 603-613; íd., “Les Traditions Apocalyptiques a Qumrán”, Apocalypses et Voyages dans l’au-delá (París 1987) 201-235.   

——

l4 K. Koch, Ratlos vorder Apokalyptik (Perplexo perante a apocalíptica) (Gürersloh 1970). 

l5 ]. Carmignac, “Qu’esr-ce que l’Apocalyptique? Son emploi a Qumrán”, RdQ 10 (1979-81) 3-33. 

l6 J.]. Collins (ed.), Apocalypse. The Morphology 01 a Genre (Missoula 1979) (=Semeia 14). 

17 D. Hellholm (ed.), Apocalypticism in tbe Mediterranean World and in tbe Near East. 

Proceedings of the International Conference on Apocalypticism. Uppsala, August 12-17, 1979 (Tubinga 1983).

l8 Da sua longa lista de trabalho sobre a apocalíptica, podemos ressaltar como mais característicos: P. Sacchi, “U “Libro dei Vigilanti” e l’apocalittica”, Henoch 1 (1979) 42-92; “L’apocalirtica e il problema del male”, Parola di vita 25 (1980) 325-334; “Ordine cosmico e prospettiva ultraterrena nel postesilio. Il problema del male e l’origine dell’apocalittica”, Riv. Biblica 30 (1982) 6-25; “Riflessioni sull’essenza dell’apocalittica: Peccato d’origine e liberta dell’uorno”, Henoch 5 (1983) 31-58; Per una storia dell’apocalittica. Atti del terzo convegno dell’Assoc. Ital. per lo Studio del Giudaismo – Idice, Bologna, 9-11 novernbre 1982 (Roma 1985) 9-34; “[ewish Apocalyptic”, 5IDIC 18 (1985) 4-9; “Enoc Etiopico 91,15 e il problema della rnediazione”, Henoch 7 (1985) 257-267; “Tesri Palestinesi +54 9 3415 42-5750anteriori al 200 a.C.”, Riv. Biblica 34 (1986) 183-204; L’apocaliuica del 1 secoio: Peccato e giudizio. Atti del Congresso Internazionale del1’AISG – S. Miniato 12-15 novembre 1984 (Roma 1987) 59-78; “L’ereditá giudaica nel crisrianesirno”, Augustinianum 28 (1988) 23-50. 

19 ]. Hartrnan, Asking [or a Meaning (Lund 1979); “Forrn and Message. A Preliminary Discussion of “Parrial Texts” in Rev 1-3 and 22, 6ff”, L’Apocalypse johannique et l’Apocalyptique dans le Nouueau Testament (Lovaina 1980) 129-149; D. Hellholm, Das Visionenbuch des Hermas als Apokalypse (Lund 1980); “The Problem of Apocalyptic Genre and the Apocalypse of john”, Soc. 01 Bib. Lit. Seminar Papen 1982 (Chico 1982) 157-198. 

40 Vejam-se os estudos citados de Sacchi e especialmente seu trabalho “L’ereditá giudaica nel cristianesirno”, 38-46. 

41 Veja-se meu estudo “Escatologização  dos escritos proféticos em Qumrán”, Estudios Bíblicos 44 (1986) 101-116. 

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